Aquilo já era mania.
Conquanto
espírita esclarecido, Alcindo Rangel cultivava a brincadeira de mau gosto.
Introduzia boatos na conversação séria ou articulava silvos agudos,
amedrontando companheiros desprevenidos.
Vez por outra,
depois de caçoada, a vítima era constrangida à medicação, a fim de se refazer.
Nas reuniões
mediúnicas, Bernardo, o amigo espiritual que o atendia, frequentemente, não se
cansava de aconselhar:
— Alcindo, meu irmão, alegria e pilhéria são assuntos opostos. Alegria é saúde espiritual, pilhéria é desequilíbrio vibratório. Gracejo inconveniente é dardo invisível. Evitemos manejá-lo. Piada infeliz pode determinar desastre e morte. Imagine você, dirigindo um carro, sob a tensão de notícia falsa ou levando um choque, de corpo desgastado pela doença.
Rangel ouvia as
admoestações, respeitoso e calado, mas prosseguia no antigo vezo. Quando não
fantasiava gemidos e clamores, ei-lo a fabricar escorpiões e cobras de borracha
ou papel, pelo simples prazer de intimidar pessoas e fazer anedotas.
Certa feita, o
diretor de oficinas veio chamá-lo no escritório para registrar a solicitação de
um cliente. Dirigindo-se para o local de atendimento, reconheceu um amigo na
presença do homem a quem observava pelas costas.
Amaciou o passo,
aproximou-se, pé ante pé, e renteando com ele, pespegou-lhe enorme grito aos
ouvidos desavisados.
O homem tombou de
susto e, com ele caiu no piso um objeto que guardava entre as mãos, produzindo
forte estampido.
Era um revólver
que o amigo trazia a conserto. Na queda, a arma disparara a última bala que se
lhe encravava no pente, alvejando Rangel no tórax e obrigando-o a receber
socorro imediato da cirurgia, com semanas de aflição e meses de hospital.
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