Violência e Paz sob os olhares do Espiritismo!

Recebemos de nosso companheiro Bismael B. Moraes, Secretário Geral do Centro Espírita Ismael, o primeiro artigo que nos leva ao conhecimento dos conflitos, guerras e a busca de paz por governos de outros países, mostrando também esses pontos sob a ótica do Espiritismo e os ensinamentos da Doutrina. É um artigo para que nos envolve em reflexões, com informações e dados atualizados. O Sr. Bismael é advogado, mestre em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Ele foi presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado, é membro da Academia Guarulhense de Letras, é autor, dentre outros, do livro "Estado e Segurança diante do Direito" (Editora Revista do Tribunais/SP) e, também, pertence à União dos Delegados Espíritas do Estado de São Paulo.  

"A Expressão 'Si Vis Pacem, Para Bellum', Numa Visão Espírita" – por Bismael B.Moraes 

À guisa de introdução
                                   Dos axiomas ou brocardos medievais até hoje usados, sem raciocinar, por pessoas aparentemente anestesiadas, dois deles - irmãos, ao que parece -, escritos em latim, sempre me deixaram perplexo: "Si vis pacem, para bellum" (Se queres paz, prepara-te para a guerra) e "Qui desiderat pacem, praeparet bellum" (Quem deseja a paz, esteja pronto para a guerra). Meu Deus! Com que lógica, racionalmente aceitável, alguém que aspire à saúde deve se preparar para a doença? Como se pode conceber, de forma ponderada, que alguém, desejando o bem, tenha que se armar para o mal?
                                   Qualquer ser humano de bom senso, ou seja, de espírito equilibrado, por certo, sabe que água e fogo, vida e morte, o bem e o mal, são coisas efetivamente distintas, para não dizer diametralmente opostas. Assim, também, oxigênio e nitroglicerina, embora elementos de Química, têm finalidades em total discrepância. Por isso - repetimos – sempre nos sentimos chocados com aquelas expressões latinas, do antigo pensador Vegecio, muito difundida por militaristas e armamentistas, bem como - e principalmente – pelos fabricantes dos instrumentos da morte, acompanhados, infelizmente, também por indivíduos interesseiros, exibicionistas e inocentes úteis, anestesiados.
                                     Ensinou Jesus Cristo, nos Evangelhos: "Conhece a verdade, e a verdade te libertará". E recomendou Mahatma Gandhi ao seu povo, na Índia, liberta do jugo inglês pela sua liderança pacífica: "Crer na verdade, raciocinar na verdade e viver a verdade". São pensamentos éticos e válidos para toda a eternidade. Por seu turno, o físico Albert Einstein, em seu livro "Como Vejo o Mundo" (Editora Nova Fronteira, Rio), dentre os muitos ensinamentos que nos deixou, três deles merecem destaque, aqui e agora: 1. "A violência fascina os seres moralmente mais fracos"; 2. "A luta pela verdade deve ter precedência sobre todas as outras lutas"; e 3. "O Estado deve ser nosso servidor e não temos obrigação de ser seus escravos". Guardemos essas lições e acompanhemos a presente análise.
Visão moral de um diplomata inspirado
                                     Recentemente, passados 10 anos dos ataques terroristas, de 11 de setembro de 2001, às Torres Gêmeas de Nova Iorque, o Ministro das Relações Exteriores do Brasil, o diplomata Antonio Patriota, conforme registra o jornal "O Estado de S. Paulo" (11-9-2011, p. A-13), acusou, em nome do governo brasileiro, "as potências militares de tentarem manter 'velhas práticas' de tomar decisões pelo restante do mundo, a alerta que intervenções são 'remédios que podem matar o paciente'. E afirma: "A guerra no Iraque e no Afeganistão mostrou os limites do poder militar: nenhum país pode estabelecer sozinho a direção do mundo, nem os mais poderosos, e temos novos atores presentes". E, depois de dizer que "o mundo bipolar acabou", citou que, no caso da invasão do Iraque, "centenas de milhares de civis morreram".
                                     Aliás, já em publicação anterior, ao escrever sobre "Direitos Humanos e Ação Diplomática" (jornal "Folha de S.Paulo", 1º/9/2011, p. A-3), o nobre Ministro Patriota afirmou: "Não nos esqueçamos de que o primeiro direito humano é o direito à vida", esclarecendo que "cada vez que a violência se dissemina, as primeiras vítimas são os segmentos mais vulneráveis: as crianças, as mulheres, os idosos, os desvalidos". E termina seu artigo, afirmando: "Não podemos correr o risco de regredir a um estado em que a força militar se transforme no árbitro da justiça e da promoção social".
                                     Quem tenha um rudimentar conhecimento do que seja fraternidade e entenda as lições do Cristo – de "amar ao próximo como a si mesmo" e de "não desejar ao semelhante o mal que não quer para si" nem para os seus -, por certo, já entende que todos os Exércitos dos países da Terra são compradores cativos da indústria mundial da morte! E como nenhum Exército existe para a paz, mas para a guerra, ou, no mínimo, como órgão amedrontador e coercitivo do Estado, deduz-se que, para "justificar" essas expectativas, toda a propaganda do militarismo, ou do "heroísmo de sangue", e a indústria desses instrumentos letais agradecem aos políticos anestesiados ou ávidos por dinheiro ou por notoriedade, eleitos com as grandes contribuições dessa indústria e as palmas dos seus donos, algozes,"acima de qualquer suspeita".                                
Silêncio sepulcral sobre a indústria da morte
                                       A propósito de mortes em guerras, revoluções, golpes de Estado, atentados terroristas, chacinas, assim como nos casos de crimes comuns – lesões corporais, homicídios, roubos, assaltos, extorsões de toda ordem, e mesmo acidentes com armas envolvendo crianças, há perguntas que, "misteriosamente", jamais são feitas, nem mesmo em teses científicas, de pós-graduação em Direito, ou em Sociologia, ou em Ciência Política: por que esse silêncio pernicioso e constrangedor, esse mutismo sepulcral, altamente nocivo aos indivíduos e à coletividade, em relação aos fabricantes de armas, munições e demais apetrechos especificamente destinados à produção de violência, de sequelas, de mortes e de lágrimas? Será que a vida humana vale menos do que as cifras e as políticas armamentistas?
Observações de um premiado com o Nobel da Paz
                                         Em seu artigo "Rearmamento do Haiti prejudica a paz", publicado pelo jornal "Folha de S. Paulo" (11-12-2011, p. A-3), o ex-presidente Oscar Arias Sánchez, da Costa Rica, na sua condição moral de ganhador do Prêmio Nobel da Paz, escreveu que, "na América Latina, a maioria dos Exércitos tem sido inimiga do desenvolvimento, da paz e da liberdade. Na América Latina, foi a bota militar que pisoteou os direitos humanos. Foi a voz do general que pronunciou as ordens sangrentas de captura contra estudantes e artistas. Foi a mão do soldado que atirou no povo inocente pelas costas. No melhor do cenários, os Exércitos significam um gasto proibido para nossas economias; no pior, uma fonte de instabilidade para nossas democracias". E, depois de inúmeros outros argumentos, apontou que os 95 milhões de dólares usados para o rearmamento do Haiti "deveriam ser investidos em educação e saúde". Usou ainda, como argumento, o processo pelo qual passou o seu país, que aboliu as Forças Armadas, e advertiu, ao final: "será um erro tentar reinstalar o Exército no Haiti". 
                                        Ao que parece, qualquer pessoa que fala em defender a liberdade e a paz, mas, hipocritamente, "releva" o poder destruidor das armas e seus fabricantes, é aquilo que os franceses mais sensíveis chamam "âme puissante a la mort" (alma afeita à morte), ou seja, é um Espírito obtuso, ainda moralmente atrasado, que se compraz com o sofrimento alheio, como ensina a doutrina espírita. Mas não é o caso do ex-presidente Oscar Arias, da Costa Rica, homem inspirado e de elevados dotes morais, direcionados à paz, com a sabedoria dos Espíritos elevados, como se vê acima.
Breve enfoque da Filosofia Espírita.
                                           Aqueles que estudam e pesquisam com seriedade, bem como todos que sabem ouvir e, ao mesmo tempo, fazer bom uso da razão, com certeza, já descobriram que o Espiritismo Cristão é uma doutrina ética. Não é uma invenção ou criação do homem. Foi revelada pelos Espíritos Mentores, através de médiuns psicofônicos e psicógrafos, e codificada em livros, no Século XIX, pelo mestre francês Hippolyte-Léon Denizard Rivail, respeitável pedagogo, conhecido pelo pseudônimo de Allan Kardec. Defende o princípio da fé raciocinada (não apenas decorando e repetindo as lições do Cristo, mas analisando tudo o que se lê, o que se ouve e o que se vê, e exercitando os bons exemplos cristãos). Essa Doutrina dos Espíritos envolve todos conhecimentos necessários ao progresso da humanidade e tem seus alicerces na Filosofia (analisando o pensamento e as ideias), na Ciência (trabalhando com a pesquisa, a experimentação e a prova) e na Religião (refletindo sobre a verdade, a moral e a fé).      
                                            Pois bem. Dos inúmeros ensinamentos espíritas, destaca-se que a moral e o intelecto nem sempre caminham juntos, ou seja, nem sempre se acham no mesmo patamar. É por isso que existem seres humanos com boa educação formal, com vários títulos, mas de procedimento incorreto e reprovável. Destarte, sendo o ser humano um Espírito encarnado, uma alma habitando um corpo, de modo passageiro (com nascimento, vida e morte física), e sendo o Espírito (que anima o corpo) o ser inteligente da Natureza e eterno, vivendo quantas vezes se fizerem necessárias ao seu progresso e aprendizado moral, em novos corpos (ora como homem, ora como mulher, como negro, branco ou amarelo), logo se deduz  haver indivíduo altamente intelectualizado, mas de princípios morais baixos. É comum encontrarmos,  nos vários cantos da Terra, pessoas que se servem de seus conhecimentos para pisar sobre os demais, para explorar os menos favorecidos, usar de falcatruas para enriquecer de forma ilícita ou se manter em posição de destaque, enquanto muitos morrem ou sofrem, em decorrência de seus atos.
Lições dos Espíritos sobre a guerra
                                              Em "O Livro dos Espíritos", de Allan Kardec (Edições FEESP, tradução de J. Herculano Pires), obra que é a expressão máxima da Filosofia Espírita, no  Livro Terceiro, Capítulo IV, no Título III, que trata da Lei (natural) de Destruição, na questão 742, encontramos a seguinte lição: "A causa que leva o homem à guerra é a predominância da natureza animal sobre a espiritual e a satisfação das paixões. No estado de barbárie, os povos só conhecem o direito do mais forte, e é por isso que a guerra, para eles, é o estado normal". E, depois de esclarecer, na resposta à questão 743, que a guerra desaparecerá da face da Terra, "quando os homens compreenderem a justiça e praticarem a lei de Deus", o Espírito Mentor alerta  que aquele "que suscita a guerra em seu proveito é o verdadeiro culpado e necessitará de muitas existências para expiar todos os assassínios de que foi causa, porque responderá por cada homem cuja morte tenha causado pra satisfazer a sua ambição". 
Analisando a busca da paz e um artigo desconcertante
                                                De longa data, temos procurado fazer um proposital questionamento: se todos os indivíduos, pobres ou ricos, analfabetos ou letrados, dos campos ou das cidades, se dizem contrários à violência e à morte por armas e são favoráveis à segurança e à paz, e - mais ainda – dizem defender a democracia, por que a humanidade ainda não alcançou a realização dessa vontade coletiva? Claro: é porque cada ser humano está na faixa moral do Espírito que anima seu corpo, sendo, às vezes, mais adiantado moralmente, noutras vezes, mais atrasado, nas várias encarnações e experiências por que passou. Terá que renascer muitas vezes, para, com esforço, aprender o consenso do bem.                                                 
                                                 Como se depreende da leitura do Capítulo XX, de "O Livro dos Médiuns", de Allan Kardec (tradução de J. Herculano Pires, Editora LAKE, 23ª edição, SP), a mediunidade é um dom concedido por Deus ao ser humano para realizar o bem, mas há  Espíritos atrasados, que só a empregam para a prática do mal, em decorrência de seus interesses egoísticos e da falta de freios morais, independentemente dos títulos, diplomas e dotes intelectuais que possuam.
                                            Mas, nessa curta análise sobre armas e guerra sob a ótica espírita, surpreendemo-nos com a leitura de um artigo de Daniel Mack, sob o título de "Armamos Ditadores" (Folha de S. Paulo, 22-9-2011, p. A-3). Ele nos dá conta de que o nosso país, com sua indústria bélica, exportou pistolas para a Líbia (do ditador Gaddafi); também, para a Argélia, para a Tunísia e para o Egito (do ditador Mubarak), assim como vendeu 2 milhões de dólares e munição para o Zimbábue (do ditador Mugabe) e 50 mil armas para o Iêmen, além de mísseis para o Paquistão e bombas cluster para a Malásia. E conta, ainda, da venda de quase 1 milhão de armas para os Estados Unidos e cerca de 30 milhões de munições para o Reino Unido! Observamos, a propósito, que há inúmeras maneiras de progredir e auxiliar a humanidade por meios moralmente defensáveis, mas, ao que parece, a vida humana vale menos do que os interesses egoísticos e grupais dos indivíduos dotados de conhecimento e  em posição de destaque, mas ainda são Espíritos obtusos e vaidosos.
Por que devemos nos orgulhar do Brasil...
                                           Orgulhemo-nos do Brasil, porque é um país gigante, cheio de amor, fartura e trabalho, e está sempre de braços abertos para o mundo; orgulhemo-nos do Brasil, porque não mais é chamado pejorativamente de "republiqueta das bananas" nem é objeto de gracejos da parte de europeus e norte-americanos; orgulhemo-nos do Brasil, porque, pelo esforço e a perseverança de seu povo, conseguiu tirar mais de 40 milhões de seus filhos da estrema miséria, mostrando-lhes novas perspectivas; orgulhemo-nos do Brasil, porque, desde de 1934, garantiu o voto livre às mulheres, que são as queridas mães, filhas, avós, netas, esposas, tias e sobrinhas desses homens vaidosos; orgulhemo-nos do Brasil, porque, após mais de um século de dívida e subserviência a potências estrangeiras, é, por fim, credor de seus credores; orgulhemo-nos do Brasil, porque, depois de dois longos períodos de ditaduras, - com a perda de vidas e de liberdade de tantos mártires – hoje, respira democracia; orgulhemo-nos do Brasil, porque, ao tempo em que existem países com mulheres ainda em estágio de escravidão, 52% das brasileiras já são eleitoras e 57% da população universitária são do sexo feminino; orgulhemo-nos do Brasil, porque  recebe e convive fraternalmente com pessoas de todos os cantos da Terra, interna e externamente, sem choques de qualquer natureza; orgulhemo-nos do Brasil, sem menosprezar as demais nações do mundo, porque ele é, efetivamente, "o coração do mundo e a pátria do Evangelho"; mas, não nos orgulhemos do Brasil e, sim, oremos às falanges do bem em seu favor, porque ele é, também, mais um fabricante de armas que se prestam à violência e à morte! 
À guisa de conclusão
                                             Finalmente, devemos relembrar a existência de um ensinamento cristão que manda não desejar para o semelhante quilo que você naturalmente não quer para si mesmo. Ora, se eu quero a amizade de alguém, devo ser amigo desse alguém; se eu quero reconhecimento pelos meus atos, eu também devo reconhecer o valor do semelhante; se eu não quero ser maltratado, eu não devo maltratar o semelhante;  se eu não quero ser ferido, eu não firo o semelhante; se eu não quero ser humilhado, eu não devo humilhar o semelhante, e assim sucessivamente. Da mesma forma, se eu quero ser um médico, eu devo estudar Medicina; se eu quero ser engenheiro, devo estudar Engenharia; se eu quero ser cozinheiro, devo aprender os segredos dos temperos e da cozinha. Igualmente, se eu quero paz, devo me preparar para a paz, aprender a ser pacífico, como recomendou o Cristo, e não me preparar para a guerra e me armar até os dentes. Logo, a expressão "Si vis pacem, para bellum", (se queres paz, prepara-te para a guerra), é totalmente contrária ao bom senso, à harmonia, à fraternidade, ao diálogo, ao sentimento cristão; é própria dos Espíritos ainda selvagens e insensíveis!
                                            Que as luzes divinas clareiem nossas mentes e que os Espíritos da paz  inspirem as pessoas de bem a se oporem aos mercadores da violência, dos crimes e das guerras. Muita paz a todos.
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São Paulo, fevereiro de 2012                      

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